Quem você poderia ter sido? (Torna-te quem tu és!” – Nietzsche).
Não! Não estou falando o quê, mas quem você poderia ter sido.
Isso mesmo: essa é a pergunta-chave que não soubemos nos fazer quando jovens. Nem poderíamos. Há que se caminhar sobre cascalhos para se achar ouro. Não fui eu que escrevi essa frase que trás um lindo ensinamento; apenas a modifiquei um pouco. Helena Kolody – poeta – apresentada a mim por Rubem Alves em sua linda crônica “Ensinando a tristeza” – quem a escreveu (“Busca ouro na ganga da vida.
Que esperança infinita no ilusório trabalho…
Para cada pepita, quanto cascalho”.).
Sim! Estou tentando falar de felicidade. Assim como ouro, é preciso aprender a procurá-la e isso só se faz amadurecendo, caminhando através do tempo.
Não é olhar para trás ou para frente o que fará diferença. É o olhar para dentro de si. Enxergar seu ser entranhado. Tocar sua própria alma.
Para Aristósteles a felicidade está no equilíbrio, na média entre o vício e a virtude.
E para você? E para mim?
No romance “Quando Nietzsche chorou”, há uma questão importante sobre a vida. Disse Nietzsche ao médico Josef: “nós devemos morrer, mas na hora certa. A morte só não é aterrorizante quando a vida já se consumou. Sua vida já se consumou?”.
A provocação questiona se, de fato, aproveitamos a vida. E, de forma ainda mais brilhante, no diálogo fictício com o médico, ele quer saber: se pudéssemos viver novamente e pra sempre, fazendo tudo igualzinho, sem tirar nem por, repetidas vezes, e tudo o que não vivemos guardar dentro de nós eternamente, seria aceitável? Seria uma boa ideia? Seria suportável?
No embate com o médico que acredita não ter mais tempo de viver outra vida, o metafórico filósofo nos estimula à mudança e libertação de nossas amarras morais e dogmas sociais etc; diferentemente do conceito Aristotélico, que nos enquadra dentro de uma moral do homem médio para que possamos ser felizes.
Eu não estou propondo nada, nem querendo fazer juízo de valor sobre a sociedade, costumes, moral ou o que o valha. Minha pena não escreveria tão longe sem que acabasse a tinta da razão e acusasse o pífio conhecimento que tenho sobre a natureza humana. Tão pouco pretendo fazer filosofia barata; não me atreveria a tanto. Apenas estou refletindo sobre uma escolha singela e tão pequena quanto o Monte Everest: quem você poderia ter sido ao invés de ter pensado em o quê você poderia ter sido. Afinal, quem quando criança não ouviu a pergunta: “o quê você quer ser quando crescer?”.Duvido que alguém tenha escutado: “quem você quer ser quando crescer?”.
Entre o “o quê “ e “quem” há uma enorme diferença. Como nas proposições Aristotélica e Nietzschiana. O segundo se contrapõe com muita veemência frente ao primeiro.
Na hipótese de você ter pensado em “quem”, que rumo você teria tomado? Quais seriam seus pruridos hoje? Seria você mais feliz?
Costumo dizer que o tempo não passa, nós é que caminhamos por ele. Portanto, o futuro nunca saberemos até que o alcancemos, tornando-o presente. Estranho, entretanto: não parece a felicidade estar em algum lugar e tempo que não o aqui e agora?
Talvez uma boa medida para colecionarmos menos cascalhos até encontrarmos algumas pepitas, seja lançarmos mão, uma vez mais, de Nietzsche e um dos seus aforismos:
“Torna-te quem tu és!”.
Alexandre
18/07/20
4 Comments
Chimicatti
To be or not to be! Sua crônica aponta, com a racionalidade que lhe é peculiar, para o norte do pensamento moderno cujo ter deveria se subjugar ao ser! Muito bom enlace de ideias e de ideais!
Tarcísio PintoFerreira ok
Aos poucos vc vai revelando novas facetas do seu saber, né Câmara? Agora, o tenho, também, como um senhor filósofo.Que venham novas surpresas!
Alexandre Câmara
KKKKK, sempre generoso, Dr. Tarcísio. Obrigado pelo comentário.
Alexandre Câmara
Obrigado, Chimi. Essa, talvez, seja a questão que não quer calar há séculos…