Preconceito
Quando tocamos em algum assunto meio espinhoso, em qualquer área humana, podemos observar velado desconforto a respeito. Muitas pessoas tendem a negar a realidade utilizando subterfúgios – num contorcionismo de ações, palavras ou até de silêncio – na ânsia de livrá-las da saia justa. Incluo-me nessas tentativas; por vezes fundadas na hipocrisia, outras na ignorância ou ainda na falta de capacidade, em muitos casos, de lidar com o que chamo de verdades duras! A pergunta é: por que não as encaramos? Seres racionais que somos, nos camuflamos e nos escondemos atrás de escudos imaginários (desrazão?). Abraçamos a sublimação como nossa tábua de salvação e seguimos firmes em nossa capacidade de…
Eu, dentro de mim…
O grande Mário Quintana, quando perguntado se temia a morte, disse ter muita vida dentro de si. Isso me tocou fundo e achei lindo O eterno, por certo, aquele escritor carregava com clareza. Refleti sobre esse sentimento de amor à vida e sobre a incerteza da não existência e o que tenho dentro de mim para poder amar tanto a vida, a exemplo de Quintana. A resposta não é simples. Invejei o escriba, confesso. Dentro de mim há a imensidão escura do universo inexplorado… o agudo da dúvida a ecoar a sua nota mais alta do por quê. Não percebo a eternidade em meu ser. Sei porém, meus ouvidos e…
Dia dos pais
A vida é de amargar mesmo. Ela tira e põe a todo o momento. Meu querido pai não está mais entre nós para que eu possa abraçá-lo. Mas… sempre tem um “mas”… tenho meus filhos a me abraçar. Por consequência e honra abraço meu querido pai. Excepcionalmente, nesse maldito ano de pandemia, o abraço, no dia dos pais, toma uma dimensão diferente, cujo esforço resulta na demonstração do que é amor. Em suas idiossincrasias meus filhos enfrentaram seus receios, tratos com seus pares e consigo mesmos e vieram me abraçar tocando os pés, cotovelos e punhos cerrados. Um abraço diferente e inventado, certamente, por nós, brasileiros, que não vivemos sem…
Que tal não morrer?
Tanto já se falou; razão para quase todos, mas não todos, porém. Aos desamparados que não têm como permanecer em casa confortavelmente, ou nem casa e mínimas condições sanitárias têm; àqueles que têm que garimpar diariamente pelo pão para sobrevivência; para aqueles outros que desempenham trabalhos essenciais à sociedade; enfim, para tantos que, obrigatoriamente, não podem se isolar: jeito não dá jeito está dado. Resta a esse exército de bravos se cuidar e torcer para que não sejam vítimas desse inimigo invisível que, desgraçadamente, ceifou a vida de muitos e continua com ação voraz sobre a vida no mundo todo. Como uma caricatura horrenda da morte o vírus trás consigo…
NOVO TEMPO
Acabaram-se as quermesses, festas de santo, festivais de comidas, shows de artistas, acabaram os dobrados das euterpes, os carnavais, procissões, cortejos fúnebres, rodas de samba e de umbanda. Acabaram as reuniões de mesa branca, as mesas de bar já não mais há. Acabaram as missas, cultos, não haverá mais zombarias nas madrugadas, comícios e palanques. Tendas de circo não mais serão estendidas, bancas de camelôs acabaram, os mercados de portas fechadas, acabaram as bibliotecas, as boates, discotecas, findaram as caminhadas. Pedais, maratonas, acabaram as lotações dos estádios, futebol é sem público, voley, fórmula1, não há mais restaurantes, churrascos em sítios, serenatas, transeuntes descendo para o centro, só para busca do…
Bingo
Liiiinhaaa!! O grito saiu desafinado, esganiçado, como era de se esperar de um garganta com mais de meia vida. E pior, fora de hora. A linha já havia sido premiada há muito tempo e a rodada prosseguira para a premiação de cartela cheia. Do bingo. Murmúrios, risinhos, gozeira geral. Em tom contemporizador o locutor minimizou o equívoco e prosseguiu com o sorteio. Olhei para o frustrado “ganhador” e o reconheci de imediato. Era habitué do bingo. Na sexta-feira passada ele estava naquela mesma mesa, com duas balzaquianas, que, pelo jeito, conheceu lá mesmo, naquela noite. Como daquela feita, desta ele estava muito bem vestido, cabelos aparados, valorizando o grisalho apenas…
Um projeto de Nação.
Forjada pela concepção clássica, segundo a qual é o conjunto de pessoas politicamente organizadas, sob um delimitado território, é a nação o conceito que melhor lhe define. No entanto, tornou-se abjeta a nação, e, um tanto quanto, descurada pelo debate político hodierno! O que se pretende para a nação brasiliana? Aliás, o que a nação de brasilianos pretende com sua existência? Não discuto a representativa evolução ocorrida nos últimos 50 anos. Entrementes, foge ao meu espectro a capacidade desse povo em gerar, na mesma medida do seu desenvolvimento, o atraso, o desleixo, a fome e a miséria das pessoas! Talvez a causa substancial esteja na própria nação, ou, mais precisamente,…
Porque a esquerda ressuscitou os Bolsonaros!
Lembro-me quando depositei toda minha esperança em um país com justiça social, sem roubalheira e votei no Lula contra o Collor. Ouvi Collor usar de todas as artimanhas para satanizar Lula e a esquerda. Repetia, Collor, que seria o caçador de marajás. Dentre tantas outras mentiras. Sem hesitar votei no PT. À época, há quase trinta anos atrás, contava com 26 anos. Já tinha dois filhos e cria que trocar o poder de mão traria futuro aos meus rebentos. Votei várias vezes em Suplicy, Lula, Genoíno, Mercadante. Votei em FHC, Covas, Montoro. Cri serem os melhores. Sempre achei que o PT fez um bem enorme ao Brasil. Pois fez, sempre,…
O gato!
Felino auspicioso! Sabe o que é o amor sem cobrança! Cuida e conta com o cuidado, mas, cuidadoso que sói, espia a maldade na busca meditativa da vida plena. Dinâmico com a mesma miada com que é contemplativo e descansado! Este é gato: sinônimo coloquial da beleza másculo-feminina que, para os biólogos é saciável! Para os poetas, como dizia minha Nonna Noêmia Merllo Massaia Chimicatti o é insaciável por natureza, aliás, assim éramos todos nós vistos por ela naquela greta do basculante da saudosa Ametista, 49 do Bairro Prado da capital das alterosas!Nonna, aliás, sabia: todos somos insaciáveis; mais ou menos narcisistas; italianos, então, somos eloquentes. Mas o gato é…
Cotidiano pandêmico
Segunda-feira a semana começa. Já estamos na quinta? Domingo se impõe trazendo a angústia da nova semana e semana adentro caminhamos parados na quarentena, é quarta. As notícias não param, sábado: mil cento e setenta e nove mortes pela covid. Quinta-feira amanhece fria e a política em balbúrdia. Ilusão de alívio, já é sexta; nada de novo, nem a ilusão desenhada. Me chamam num Call, é terça, chegamos a 30.000 mortos; nenhum perto de mim. Pareço anestesiado… que dia é hoje? Outra live discutindo uma possível volta no meio do mês, estamos no domingo. Meio do mês chegou, já é sábado, a quarentena prossegue. E essa quarta-feira de cinzas não…