Um projeto de Nação.
Forjada pela concepção clássica, segundo a qual é o conjunto de pessoas politicamente organizadas, sob um delimitado território, é a nação o conceito que melhor lhe define.
No entanto, tornou-se abjeta a nação, e, um tanto quanto, descurada pelo debate político hodierno!
O que se pretende para a nação brasiliana? Aliás, o que a nação de brasilianos pretende com sua existência?
Não discuto a representativa evolução ocorrida nos últimos 50 anos.
Entrementes, foge ao meu espectro a capacidade desse povo em gerar, na mesma medida do seu desenvolvimento, o atraso, o desleixo, a fome e a miséria das pessoas!
Talvez a causa substancial esteja na própria nação, ou, mais precisamente, na sua ausência!
O Brasil acumula problemas, e os mais recentes fazem com que os mais remotos caiam no esquecimento e saiam das planilhas de gestão.
Cenas como a redemocratização, concepção política dos trabalhadores, planos econômicos milagrosos, caça aos marajás, fim da inflação, migalhas em forma de programas sociais de distribuição de renda, aumento da base universitária, liberalismo econômico, dentre outras, apenas para ficarmos nas quatro últimas décadas, inebriam a sociedade e geram a falsa impressão de que há um projeto de nação!
Não há!
Enquanto a desigualdade econômica e, por conseguinte a social, for abissal no Brasil, não se pode conceber um desenvolvimento nacional, sobretudo, pelo rastro de destruição humana, que tem deixado esse sistema anti-nacionalista.
Palavra, aliás, sujeita a críticas e tergiversações de tal monta, que sua absorção tornou-se sinônimo de atraso, ineficácia e malversação.
Um projeto de nação, como todos, há de levar em conta as suas múltiplas variáveis, sobretudo, aquelas cuja Constituição da República as considera como seu fundamento de existência, tal qual a dignidade da pessoa humana!
Ainda sobre o prisma da construção de um projeto, não há como pensar o presente e o futuro de uma nação, sem que temas como esse sejam levados à exaustão, na busca de sua inclusão no pensamento estruturante do pretenso projeto!
Dignidade, para o atual momento político e social, não é um conceito aberto carente de definição! É a própria definição do conceito de como deve a nação viver e de como o Estado deve provê-la.
Não se olvida que os recursos econômicos sejam imprescindíveis para a execução de um promissor projeto de nação, porém, a eleição quanto as suas prioridades, relativamente à sua aplicação, pode ser tão perversa quanto a sua não existência.
Compreendo a complexidade nacional, mas não concebo o conforto com que os gestores públicos e privados da economia real convivem com nações díspares, circundadas por um mesmo território.
Díspares quanto às suas condições de sobrevivência, quanto ao exercício do conceito de dignidade, quanto ao seu projeto de vida humana!
Não quero, contudo, fechar os olhos para os aspectos antropológicos da nação, enquanto conceito abstrato.
Já houve tempos em que mais de uma espécie humana conviveram, segundo relato histórico-científico, trazido por Yuval Noah Harari, em sua obra “Sapiens”. Época essa que trago à baila tão somente para sublinhar a perversidade auto-protetiva humana.
O Homo Sapiens, uma das espécies do gênero humano que entre si conviveram, é acusado, pelo sobredito autor, de ter sido o responsável pela destruição das demais espécies, promovendo a hegemonia humana atual!
Não quero, a partir de supostas teorias eugenistas, supor que estamos diante de situações análogas.
Se há uma nação composta por um grupo favorecido pelo desenvolvimento social, pelo acesso aos bens de consumo, aos cuidados com a saúde e, sobretudo, com a alegria de viver, há outra que sobrevive marginalizada a todos esses recursos modernos, que compõem o atual modus vivendi. E, por isso mesmo, sociologicamente poderíamos conceber, nestes tempos, a coexistência de mais de uma nação no mesmo território brasileiro (sem olvidar as várias nações ameríndias que habitam o nosso território).
Não é possível promover a conciliação nacional, enquanto não tivermos, sobre a mesa, um projeto de unificação dos valores que sustentam a dignidade humana.
Só consigo perceber uma verdadeira discussão política, na medida que os povos sejam considerados como agentes ativos da pauta, e que a economia seja tratada como o único meio de se prover a dignidade humana, sem distinção de “classes ou castas”, para que a retórica nacional desça dos palanque e assente diante das pranchetas, a fim de traçar o verdadeiro projeto de nação brasiliana!
One Comment
Alexandre Câmara
Belíssimo texto! Desejo de todos nós ter um projeto de nação que ampare a todos. Mas não creio possível dado a nossa origem e pasta. Não acredito mais nesse país.
Parabéns, Chimicatti. Texto, não de solistas, mas que merecia ser dito na Ágora de uma terra carente de voz…