Preciso ver, mas não estudei engenharia. Que pena!
Estou com degeneração macular e com o tempo terei séria limitação para enxergar. Em outras palavras: ficarei cego! A aleatoriedade da vida preferiu me brindar com a cegueira ao invés de me premiar com a mega sena acumulada. É a vida! Inteligentes buscamos compensações em tudo para aliviar a crueza da vida. Inventamos Deus e o Diabo, literalmente, para sublimar nossa existência; como diria Daniel Goleman em Mentiras perfeitas, Verdades simples. Abro parênteses porque calhou-me agora se devo escrever Diabo com maiúscula ou não, já que escrevo Deus assim. Como são entidades importantes e não faria sentido acreditar num sem acreditar no outro, entendo que devo prestigiar o sete peles…
Que tal não morrer?
Tanto já se falou; razão para quase todos, mas não todos, porém. Aos desamparados que não têm como permanecer em casa confortavelmente, ou nem casa e mínimas condições sanitárias têm; àqueles que têm que garimpar diariamente pelo pão para sobrevivência; para aqueles outros que desempenham trabalhos essenciais à sociedade; enfim, para tantos que, obrigatoriamente, não podem se isolar: jeito não dá jeito está dado. Resta a esse exército de bravos se cuidar e torcer para que não sejam vítimas desse inimigo invisível que, desgraçadamente, ceifou a vida de muitos e continua com ação voraz sobre a vida no mundo todo. Como uma caricatura horrenda da morte o vírus trás consigo…
Não aproveitamos nossos pais…
Contava com oito, dez anos… sei lá e lembro-me, perfeitamente, de meus pais, preocupados, me levando a um pediatra, na Praça da Sé. Pós consulta parávamos numa lanchonete e meu pai comprava um bauru no pão de forma e um copo de suco de laranja. Íamos e voltávamos de ônibus. Tudo pra mim era novidade e delicioso: do ônibus ao queijo quente a se esticar do pão à minha boca. Lembro-me, também, de irmos – aos domingos – a pé à casa de meu tio, irmão de meu pai, que ficava uns dez quilômetros de distância da nossa e, no meio do caminho, meu pai me punha de cavalinho, carregando-me…
O visionário, a inauguração e a viagem que não terminou…
Tudo ainda estava para terminar quando Fernando chega para a inauguração da Ferreira e Chagas Advogados -filial São Paulo. O sol, como um ponteiro de relógio, nos informava estarmos perto do meio dia. O evento seria naquela mesma noite. Fernando sem titubear fitou-me como quem dá um aviso inequívoco de que não aceitaria pagar nenhum mico frente a uma centena de convidados que viriam nos prestigiar. Naquele momento entendi o que era estar no corredor da morte. ⁃ Fique tranquilo Fernando. Dará tudo certo! Bora almoçar. Outro dardo saiu dos seu olhos claros a reafirmar que um erro seria fatal. Não nos conhecíamos muito bem e esse episódio nos revelaria,…
Hoje tenho medo!
Fui moleque valente. Hoje, homem covarde. Mas é aquela covardia boa… de quem quer apenas viver; deixar a razão sem importância de lado e buscar a leveza do ser feliz; como quem sente aquela brisa suave e mansa acariciando o rosto não mais menino. O caminhar me ensinou que quando não é fraqueza de caráter a cobardice é meritória. Hoje tenho medo! Não ouso mais coragem infantil, beligerância probatória. A testosterona não há mais em excesso; o tanto que hoje a tenho faço melhor uso e me delicio mais… Uma querida amiga enviou-me, dia desse, um texto de Adélia Prado, belíssimo, em que dizia que “a criança ignora o quanto…
Tudo mudou e nada muda: “meu pilão primeiro”.
Acordo com o dia frio e, por alguns minutos, esqueço que estou confinado. A pandemia, como um despertador, me dá a real lembrando-me de que, sim, estou confinado há mais dias do que eu poderia imaginar ser possível acontecer. Enquanto tomo meu café hesito em ligar a televisão, abrir o jornal e ligar meu computador – rotina diária – novo normal – nova onda. Hoje, porém, algo está diferente. Há alguma coisa a mais que me tira atenção, me perturba. Tem um sentimento que vem e vai como ondas mansas de um mar barulhento… Outro gole no café e a lembrança da última frase de protesto de um homem, agora…
O tempo…
Ah… o tempo… Percebem como somos apenas coadjuvantes do tempo? Como não o dominamos? O tempo nos parece algo versátil, mágico: balançando em sua gangorra misteriosa do existe, não existe… Mesmo o disfarce do que se diz atemporal, que tenta negar o tempo, acaba por caracterizá-lo. Não fosse estranho diríamos que o atemporal é o superego do tempo para chamar a atenção e lembrá-lo do ético, da moral, suplicando a não nos maltratar tanto. Falamos na atemporalidade como que para negá-lo. Tirá-lo da nossa frente, como uma revanche vingativa, ou para dele usufruirmos mais: ganharmos tempo. Submetidos damos as mãos a ele e, ao seu lado, o deixamos acompanhar nossas…
Pluma
Ei… por favor, fale mais suavemente… quero escutá-lo. Ouvi-lo falar baixinho e devagar me fará atendo. Não há necessidade de por tanta cor em seu dizer. Aprenda com o silêncio, vez por outra, poderá, ele, dizê-lo mais. Calma. Retome o fôlego. A razão poderá ser protagonista se quiser ser genuíno; não use subterfúgios, nem tergiverse; com ela essas coisas não combinam. Para a chuva tocar o chão e aplacar a quentura do sol, levar a poeira, houve um enorme caminho; manso; mudo… Posso compreender sua indignação, ainda, que não precisasse tanto. Pois que, às vezes nada há para não aceitarmos, apenas nossos pruridos por não compreendermos algo, ou, quem sabe,…
A Tourada.
Em Madri, decidimos assistir a uma tourada. Tourada é uma coisa que, parece, estar em nosso imaginário e que só existe em filmes. Por isso, curiosa e quase desconhecida para mim. Um conhecido espanhol, há anos atrás, me disse que fora os espanhóis nativos, a maioria das pessoas acha uma crueldade esta atração. No entanto, trata-se, disse ele, de uma uma questão cultural que deve ser cultuada, mantida e reverenciada em seu país e, quiçá, no mundo. Não pude concordar nem discordar, pois nunca havia visto, digamos … ao vivo, este evento. Uau!!! Só de lembrar me arrepia. O tal hispânico sabia o quê estava falando e o quê queria…
Garrucha – o matreiro curioso.
Garrucha: assim era chamado um senhor matuto de inteligência ímpar e muita perspicácia. Curioso que só, queria porque queria descobrir o preço de venda de um sítio vizinho ao seu. Antes do raiar do dia e o sol mandar a noite dormir, Garrucha já pitava seu cigarrinho de palha na soleira de seu casebre. Pensativo testemunhou o dia chegando de mansinho e a coruja se recolher conformada. Após alimentar suas crias e de café tomado arquitetou um plano para, então, ir ter com o dono da propriedade colocada à venda. Deu em sua telha de convidar o Zeca, dono de uma pequena, mas próspera loja de materiais de construção de…