• Causo,  Literatura

    O pato morreu!

    Hoje vou contar mais um “causo”. Esse, acontecido em família. Minha mãe, já septuagenária, estava deliberadamente quase surda. Para que ela  entendesse, a gente tinha de falar bem alto e ela tinha de ver o movimento labial. Escutar no telefone, então, para ela era um suplício. Pois bem, na véspera daquele dia ela tinha ido visitar  a Ica, sua vizinha de fundos. A Ica, contristada, falou para minha mãe que tinha um pato de estimação e que ele estava muito doente. Até a levou para ver o dito pato. No dia seguinte, bem cedo, toca o telefone lá em casa. Minha mãe atendeu. Era a Ica no outro lado da linha. Pesarosa,…

  • Crônica

    A Tourada.

    Em Madri, decidimos assistir a uma tourada. Tourada é uma coisa que, parece, estar em nosso imaginário e que só existe em filmes. Por isso, curiosa e quase desconhecida para mim. Um conhecido espanhol, há anos atrás, me disse que fora os espanhóis nativos, a maioria das pessoas acha uma crueldade esta atração. No entanto, trata-se, disse ele, de uma uma questão cultural que deve ser cultuada, mantida e reverenciada em seu país e, quiçá, no mundo. Não pude concordar nem discordar, pois nunca havia visto, digamos … ao vivo, este evento. Uau!!! Só de lembrar me arrepia. O tal hispânico sabia o quê estava falando e o quê queria…

  • Causo,  Literatura

    O “PRÁ” DE CINCINNATI E O “CRÔ” DE CHICAGO

    É tempo de pandemia e, na Rede Globo, retorna a novela Fina Estampa, que traz o famoso personagem Crô, interpretado de forma ímpar pelo ator Marcelo Serrado. Aliás, alto lá!! Crô é para os íntimos, o nome dele é Crodoaldo Valério. Pois bem, com o retorno da novela, me lembrei de minha primeira viagem internacional à trabalho. Fui, com meus sócios Fernando Fraga e Hebert Chimicatti, para os EUA, mais precisamente para Cincinnati, onde teríamos uma reunião com os advogados de lá. Aqui é preciso abrir um parêntese. Antes de ir para Chicago, a cidade do Crô, preciso falar da reunião no escritório de advocacia americano. A reunião, com dois…

  • Crônica,  Literatura

    DUELO DOS INDECENTES

    Certa feita, em furtiva e despretensiosa conversa, Luiz Chimicatti, meu irmão e colega de profissão, afeito à ciência do direito penal, saca da cartola a seguinte questão: qual seria a natureza jurídica do duelo?Intrigado com a proposta de reflexão, de chofre, me antepus à resposta, sob o argumento de que não de se poderia pensar juridicamente sobre fato da vida que não encontrasse proteção do direito e que se diz ante-jurídico de nascença!Ora, é de sabença notória que o duelo é um meio de que duas pessoas se valem para, reciprocamente, praticarem crime de homicídio, indubitavelmente, doloso, eis que é da essência dessa biunívoca disfunção social, a vontade preordenada e…

  • Causo

    Garrucha – o matreiro curioso.

    Garrucha: assim era chamado um senhor matuto de inteligência ímpar e muita perspicácia. Curioso que só, queria porque queria descobrir o preço de venda de um sítio vizinho ao seu.  Antes do  raiar do dia e o sol mandar a noite dormir, Garrucha já pitava seu cigarrinho de palha na soleira de seu casebre. Pensativo testemunhou o dia chegando de mansinho e a coruja se recolher conformada.  Após alimentar suas crias e de café tomado arquitetou um plano para, então,  ir ter com o dono da propriedade colocada à venda. Deu em sua telha de convidar o Zeca, dono de uma pequena, mas próspera loja de materiais de construção de…

  • Conto,  Literatura

    Filho do Bigode

    O Lourdes, em Belo Horizonte, pelo meio dos anos oitenta, era um bairro essencialmente residencial. Ainda existiam ali, antes das grandes construtoras entrarem e verticalizarem tudo, muitos casarões antigos, que abrigavam famílias que se conheciam pelo nome, nas suas ruas sombreadas por árvores frondosas, onde se viam rodas de idosos sentados nas calçadas a ler o jornal, ou disputando jogos de dama, meninos descendo as ladeiras em seus carrinhos de rolimã, senhoras com meninos de colo fofocando na rua, o que transformava o bairro, quase na virada do século vinte, meio que em uma cidade do interior, encravada dentro de uma capital. Esse era o clima! E lá vivia o…

  • Causo,  Literatura

    O Passarinho, a porra do Coelho e o Brasil

    Vou contar um “causo” do início da minha carreira. Quando iniciei minha vida acadêmica, estava sedento para arrumar um estágio em um escritório de advocacia. Queria viver o dia-a-dia de um advogado e queria, sobretudo, usar terno! Ok, hoje estou preferindo uma sunga. Tive, então, a oportunidade de trabalhar no escritório do Dr. Paulo Passarinho, um dos maiores advogados que conheci. Além do seu primoroso conhecimento técnico e dos seus ternos bonitos, ele era colecionador de canetas, cada uma mais bonita que a outra, e aquilo me fascinava – terno, escritório, caneta, processos, Diário Oficial imprenso, enfim, um mundo novo, hoje velho. Além de ler, todo santo dia, o Diário…

  • Crônica

    O Dourado e o Pescador.

    O Dourada, fisgado, salta metro e meio fora d’água. Seu brilho refletido por um sol intenso, nos prestigia e exibe um balé sobre as águas do rio Aquidauana – no Pantanal mato-grossense. Estava-se diante de um bravo. Seu esperneio e força excitam e comovem, dando a exata dimensão  do que significa coragem e força. Sua silhueta brilhante, voando alto, tenta cuspir, chacoalhando sua cabeça de lado a outro, o anzol assassino entranhado em seu beiço duro.  O bicho luta feito um samurai flutuando acima d’água. Do ar mergulha sob um rio caudaloso e escuro; imerge e feito um torpedo certeiro, à flor da água, segue em direção ao barco numa…

  • Conto,  Literatura

    Reais!

    Em Curitiba, 24 de maio. Ano do Senhor de 1999.  Há mais de 5 anos que não vinha nesta cidade.  Muitas novidades: Rua 24 Horas, já imaginaram que legal? Tudo funcionando, ininterruptamente: lanchonetes, bares, farmácias, floras, lojas de discos, tudo enfim.  E aquele movimento incessante de pessoas de todas idades. 21:00 hs, refestelo-me na cadeira confortável, para curtir aquelas duas horas de que dispunha, para lazer, antes de me recolher para o sono reparador. Nuuu, como desceu bem aquele primeiro copo de chopp, super gelado! Observo o povo, nem bonito e nem feio, bem vestido e agasalhado, maçãs de rosto coradas. Bem nutrido! E me lembro do nordeste, com seus…

  • Crônica,  Literatura

    “LIBERTAS QUAE SERA TAMEN”?

    Tal qual nosso conjunto orgânico, formado e desenvolvido para que, harmonicamente, realize as funções vitais do nosso corpo, assim o é a sociedade, com as escusas cabíveis pela obviedade dessa assertiva. Do mesmo modo são os interesses e as ocupações mundanas, eis que, o cuidado redobrado, o debate intenso e o temor da perda de uma das funções vitais, somente se reverberam nos momentos cuja perda ou deterioração dessas atividades vitais esteja eminente. Assim tem sido no quesito liberdade… um dos pressupostos da convivência harmoniosa da sociedade, aliás, experimento recente sob a lupa da história contemporânea em virtude da qual o filósofo Jean-Paul Sartre (1905-1980) disse: “estamos condenados a ser…